Caíram, como cruéis e hórridas hastas,
Nas suas 33 vértebras gastas
Quase todas as pedras tumulares
A frialdade dos círculos polares
Em sucessivas atuações nefastas
Penetrara-lhe os próprios neuroplastas
Estragara-lhe os centros medulares
Como quem quebra o objeto mais querido
E começa a apanhar piedosamente
Todas as microscópicas partículas
Ele hoje vê que após tudo perdido
Só lhe restam agora o último dente
E a armação funerária das clavículas
Esse é, de longe, o meu poema favorito do Poeta Raquítico. A sensação que passa é de um desolamento sem limite, uma falta de esperança, um vazio existencial que, mesmo sendo temas recorrentes na obra do autor, estão aqui muito bem retratados.
Pode-se notar que o poema fala de morte, começando com um enterro. O solo em que o personagem clamado pelo eu-lírico torna-se bruto com ele, usando inclusive de uma aliteração de fonemas com R (caíram, cruéis, hórridas, trinta e três, vértebras e pedras) para dar a idéia de esmagamento dos corpo sendo enterrado.
Na segunda estrofe, o uso de termos cientificistas (uma das marcas registradas do autor) serve para mostrar a deterioração do corpo por agentes externos (No caso, A frialdade dos círculos polares), contínua e inevitável (Em sucessivas atuações nefastas), mas uma vez declamando o desespero do autor em relação a condição efêmera da matéria viva. Nota-se que ele faz uso do sistema nervoso (neuroplastas) e sanguíneo (centros medulares), representando, assim, a mente e o organismo, ambos consumidos ao nada.
Por fim, a elevação e a chave de ouro tornam o poema várias vezes mais profundo. Nota-se um profundo arrependimento, uma angústia infinita, o desespero de quem perdeu tudo, reduzido ao absoluto fracasso do nada. Poucos poemas são capazes de transmitir uma sensação de incerteza qual a que se encontra ao final desses versos, nota-se que ainda falta alguma coisa, que ainda há um vazio.
Sem mais, um desenho: